Advogando no Marajó - A história da barata amazônica e a advogada pernambucana
Há uns 4 anos tive que passar uma
semana na Ilha do Marajó para regularizar a situação fundiária e registral de
um cliente de São Paulo. As certidões das terras que ele queria adquirir tinham
diversas inconsistências que precisavam ser conferidas, e não havia jeito de se
fazer isso à distância, tinha que ir ao cartório do município em que as terras
se encontravam.
Para chegar lá, era preciso ir de
avião até Belém e depois tomar uma balsa que levava duas horas até a Ilha.
Interessante já daí é que, quem navega pelas águas dos rios da região norte tem
a impressão clara de estar em um oceano, pois é impossível ver no horizonte a
outra margem.
Na tal cidadezinha, tive que me
hospedar na única pousada, bem nas margens da Baía de Marajó. O hotel era muito
simples, mas não tinha outra opção. O quarto só tinha a cama e uma mesinha com
duas cadeiras de madeira bem duras, que foi onde trabalhei intensamente durante
quase todo o tempo em que ali fiquei. Mas, no meu olhar otimista, estava tudo
bem, pois tinha água quente e ar condicionado. Percebi depois que a água quente
nem era necessária, já que a gente só deseja um banho frio no calor daquelas
bandas do país.
Trabalhei intensamente naquela
semana, entre Prefeitura, Cartório e hotel. Toda noite ia para o
restaurantezinho da pousada – suspenso por palafitas nas margens do rio. Numa
das noites, particularmente, houve uma infestação de grilos que mais pareciam
baratas, de tão grandes e escuros. Resultado: corri para o quarto e por lá mesmo
fiquei. No dia seguinte, no caminho para a Prefeitura me deparei com o cadáver
de um inseto tão grande que não me contive e perguntei ao mototaxi que estava
próximo: – que bicho é esse? – barata d’água, ele me respondeu. Fiquei
impressionada com o tamanho, pois devia ter uns dez centímetros, mas segui
adiante.
O trabalho que tive naqueles dias
por lá foi realmente intenso e foi, de fato, muito importante ter ido
pessoalmente, pois só com as conferências e correções feitas no registro
imobiliário foi possível se ter segurança jurídica e efetivar a compra e venda
em questão. O cartório de lá não tinha nada digital e todos os registros ainda
eram feitos de forma manuscrita em livros imensos, o que tornava tudo ainda
mais lento e trabalhoso. O danado é que tinha grilo até dentro desses livros
registrais, e que susto levei quando alguns deles pularam de dentro quando a
registradora abriu um dos livros!
Creio que foi nesse mesmo dia que
fiquei no Cartório trabalhando com a registradora até umas 21:00h e não havia
outro transporte na cidade para voltar para a pousada, senão a moto de seu
marido. Ele – o marido da registradora – alertou-me que o único problema eram
as baratas d’água que voavam e podiam morder. Fiquei sem ar, pensando naquele
bicho enorme que vi no caminho para a Prefeitura dias antes! Mas não tinha
jeito. Subi na garupa da moto e me encolhi o máximo que pude atrás daquele
homem franzino. No caminho, além de sentir medo, tive também vontade de rir me vendo
naquela situação e imaginando a cara do pessoal do escritório se pudesse
presenciar aquela cena. No fim das contas deu tudo certo. Nenhuma barata me
atacou e o propósito da minha visita àquele recanto longínquo foi atendido. Uma
lição, todavia, levei dali: como precisamos de pouco para viver! Naquela semana
eu só tinha uma cama, mesa e cadeira em um quarto muito simples com banheiro,
mas estava tudo bem. Trabalhei e produzi muito e falei, mesmo à distância, com
várias pessoas que amo. Levarei em minha memória aqueles dias diferentes que
passei no Marajó.
Na foto, Sandra Pires, Advogada e Sócia em Pires Advogados e Consultores.
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